O burburinho era como uma corrente viva, espalhando-se pela Arena Leste conforme cada novo estudante entrava. Não eram apenas curiosos da Classe E-1. Estudantes da Classe D e C, membros importantes das facções Alvorada Arcana, Lâminas do Crepúsculo e Punhos de Aço, todos se reuniam, ocupando os anéis das arquibancadas com olhos famintos. Algo fora do comum estava para acontecer, e o cheiro da tensão misturava-se ao aroma rúngico que pairava na atmosfera encantada.
No centro, Bryan estava parado como um espectro entre realidades. Seu corpo relaxado, mas seus sentidos afiados como a lâmina de uma adaga. Nenhuma agitação, nenhum traço de ansiedade: apenas uma mente fria e calculista, estudando cada movimento de Kyle Trevane.
Quando Kyle propôs a aposta absurda de 8000 pontos, Bryan sentiu um leve calafrio de excitação. Aceitou sem hesitar. Ele não tinha pontos para oferecer — mas também não planejava perder.
As runas douradas do contrato cintilaram ao selar a aposta.
Assim que o Mestre Mervin autorizou o início, Bryan, sem fazer movimentos vistosos, sussurrou mentalmente:
— Sistema. Análise de Combate.
Num instante, sua percepção do mundo mudou.
Era como ver uma cortina sendo arrancada. As articulações de Kyle destacavam-se em traços sutis. Pontos de tensão nos ombros, nos joelhos, nos pulsos. Ritmo da respiração, descompasso nos feitiços de reforço. Cada falha, cada brecha, cada possibilidade de morte — desenhadas diante de seus olhos como linhas invisíveis de destino.
Kyle avançou, envolvendo-se em ventos cortantes e faíscas verdes. Seus feitiços eram eficientes, mas cheios de espaços mortos.
Bryan sacou suas espadas curtas com um movimento tão fluido que sequer produziu som.
A lâmina da mão direita desenhou um arco sutil no ar, desviando o primeiro chicote de vento.
A da esquerda, cortou o véu de magia que Kyle projetava como uma parede.
O confronto era feroz. Kyle atacava com velocidade, com furor, como se cada golpe fosse esmagar Bryan por pura força.
Mas Bryan era um rio.
Dobrou-se sob os ataques. Esquivou-se, deslizando pelas aberturas mapeadas pela Análise de Combate. E quando atacava, era como uma picada venenosa: rápida, precisa, devastadora.
Kyle recuou, ofegante, os olhos arregalados.
Ele percebeu, tarde demais, que Bryan não estava reagindo — estava prevendo.
Então Bryan aplicou o que havia aprendido.
Deslizando pela lateral do ataque de Kyle, seus movimentos fluiram para um novo padrão de esgrima: "Trência de Aço e Vento" — uma técnica descrita em um dos grimórios que estudara na biblioteca.
Girou seu corpo, suas lâminas cortando o espaço com um silvo mortal. Cada passo encaixava no ritmo do adversário, quebrando sua postura sem que Kyle percebesse.
A primeira estocada abriu a guarda de Kyle.
A segunda rasgou a proteção mágica no flanco esquerdo.
A terceira, uma estocada invertida, parou a centímetros da garganta do oponente.
E nesse instante, como se o próprio sistema reconhecesse, algo dentro de Bryan mudou.
Ele não apenas lutava.
Ele dominava.
O conhecimento teórico se solidificou em prática perfeita. Sua mente e seu corpo se fundiram em uma dança letal.
Sentiu-se mais rápido. Mais afiado.
Bryan recuou dois passos, girando as espadas em um movimento tácito.
O Sistema reconheceu:
"Nova Habilidade Adquirida: Fluência Marcial — Aprimora a capacidade de adaptar estilos de espada em combate vivo, reduzindo falhas técnicas e aumentando precisão em 15%."
Kyle rosnou. Seus olhos verde-musgo cintilavam com desespero agora.
Ele rugiu, liberando sua mana em uma última tentativa desesperada, cobrindo seu corpo com armadura etérea.
Mas Bryan já era outra criatura.
Com a Fluência Marcial reforçando cada fibra de seus músculos, esquivou com elegância. Contra-atacou em três golpes: um para desarmar, um para desequilibrar, um para finalizar.
Quando Kyle caiu de joelhos, arfando, Bryan sentiu aquilo de novo.
a sua fome, aquela torrente rubra e quente borbulhando no fundo do peito.
O controle vacilou.
A aura de Bryan explodiu como uma tempestade primitiva.
Seus olhos tornaram-se poços de vermelho-sangue.
Ele investiu contra Kyle não como um duelista, mas como um predador.
Chutou o peito do adversário, fazendo-o voar e quicar no solo.
Avançou antes que o corpo parasse, agarrando-o pelo colarinho, levantando-o como uma presa morta.
Só parou quando sentiu a resistência sumir.
O bracelete de Kyle piscou discretamente.
Bryan soltou-o como se fosse lixo.
O chão tremeu com o impacto.
O campo brilhou, selando o duelo.
Mervin começava a se mover para intervir, mas já não era mais necessário.
Bryan, parado, respirando devagar, deixou o vermelho sumir dos olhos.
Ele não havia apenas vencido.
Tinha esmagado.
E pela primeira vez desde o início, a arena inteira permaneceu em silêncio absoluto.
Todos haviam testemunhado algo que não compreendiam completamente.
Mas sabiam, instintivamente, que o mundo deles havia mudado.
Bryan Blake não era apenas um estudante comum.
As arquibancadas da Arena Leste permaneciam mergulhadas num silêncio tenso após o fim abrupto do duelo. Não havia mais gritos, nem aplausos. Apenas olhares fixos, carregados de uma mistura incômoda de medo, respeito e incredulidade.
Entre os representantes da Alvorada Arcana, o impacto foi imediato.
Hanna Velmira descruzou lentamente os braços, sua expressão antes levemente divertida agora tomada por uma frieza calculada. O sorriso em seus lábios desaparecera, substituído por um franzir de cenho preocupado. Ela virou o rosto para Selena Mirkh, que estava pálida, os olhos dourados estreitos.
— "Isso não é apenas talento bruto." — Hanna disse em tom baixo, as palavras escorrendo como lâminas geladas. — "É formação. Instinto assassino polido."
Selene apertou a borda da cadeira.
— "Ele quase matou Kyle sem usar magia ofensiva. Quase como... um predador contido."
Naevys Alcor cruzou os braços, olhando para Bryan como se observasse uma fera desconhecida.
— "Deviámos considerá-lo um problema." — murmurou. — "Um que crescerá se o ignorarmos."
Hanna não respondeu de imediato. Seus olhos dourados, típicos da Alvorada Arcana, brilhavam de uma maneira estranha — um misto de respeito relutante e irritação.
Enquanto isso, entre os membros do Punhos de Aço, o sentimento era outro.
Deyron Orkan soltou uma curta risada pela narina, os braços cruzados sobre o peito largo.
— "Finalmente... Alguém que luta como deveria." — disse, com um tom quase satisfeito.
Ao seu lado, Kael von Rheinhardt observava Bryan com olhos semicerrados.
— "Mas ele é instável."
Deyron apenas sorriu, um sorriso duro.
— "Instável ou não, ele venceu. E esmagou um veterano da Classe B em público. Isso muda a hierarquia."
Por outro lado, entre as fileiras das Lâminas do Crepúsculo, a atmosfera era ainda mais silenciosa.
Uma jovem de cabelos claros e ondulados, sentada nas primeiras fileiras — Yvaine Serenn — inclinou-se para a colega ao lado, seus olhos prata vibrando de tensão contida.
— "Você viu como ele movia? Não era só habilidade... parecia que ele enxergava o futuro de Kyle."
A outra garota, cabelos castanhos escuros, respondeu em um sussurro:
— "Era como se cada movimento dele fosse predestinado... preciso demais para ser normal."
Yvaine apertou a barra de sua capa.
— "Não deveríamos antagonizá-lo."
Mais acima, oculto nas sombras, um dos observadores seniores da facção sorriu levemente.
— "Ou deveríamos recrutar... antes que o Alvorada tente."
No campo, os membros do grupo de Kyle estavam à beira do pânico.
Ryan Velk — o dos cabelos pretos bagunçados — apertava os punhos, os olhos arregalados.
— "Kyle... ele... ele foi destruído."
Luenn Arvak sacudia a cabeça, incapaz de encontrar palavras. Sua boca se movia, mas apenas ruído incoerente saía.
Melissa Dalven, a garota de cabelos negros longos, manteve a calma superficial, mas suas unhas cravadas no banco de pedra denunciavam a tensão. Ela murmurou, como se para si mesma:
— "Não foi uma luta. Foi uma execução."
Tessa Ryn, com seus cabelos dourados cacheados, sussurrou:
— "O que vamos fazer agora? Kyle... perdeu todos os pontos... e a reputação..."
Ryan olhou ao redor, como se a própria estrutura da hierarquia da Academia estivesse desmoronando sob seus pés.
Melissa estreitou os olhos, encarando a arena onde Bryan permanecia parado, solitário.
— "Isso... não vai acabar aqui."
Um leve sorriso frio curvou seus lábios.
— "Esse duelo... foi apenas o começo."
Ao redor da arena, o rumor silencioso de mudança começava a circular. Grupos cochichavam, alianças silenciosas se formavam, antigas suposições eram destruídas. Algo no status quo da Academia de Elyndor havia se quebrado.
E no centro de tudo isso, sem parecer se importar, enquanto se dirigia até Mervin.
Estudantes de todas as classes — E, D, C e até alguns B — observavam Bryan Blake como se estivessem diante de algo que não deveriam ter testemunhado. Um predador em pele humana, camuflado sob a máscara de um novato. A comoção foi tamanha que até alguns instrutores presentes trocaram olhares cautelosos, como se estivessem reavaliando tudo o que achavam saber sobre a nova geração.
O sistema da Academia, eficiente e impiedoso, notificava automaticamente as recompensas e penalidades. Quando Bryan verificou seu dispositivo, o painel holográfico projetou:
[Pontos de Contribuição Obtidos: 8200]
Incluía a aposta selvagem de 8000 pontos e a bonificação especial concedida por Mervin Calder pela façanha extraordinária de derrotar um oponente quatro Tiers acima, algo quase inédito na história recente da Academia.
Mervin, com seu andar pesado e olhos avaliadores, aproximou-se, a aura de veterano endurecido oscilando ao redor dele.
— Você tem permissão para se retirar, Blake. — disse, a voz roçando em respeito genuíno. — E pegue isso também.
Uma notificação extra piscou:
[Bônus Especial: +500 Pontos de Contribuição]
Bryan apenas acenou, sem teatralidade, sem a mínima arrogância. Com passos firmes e silenciosos, deixou a arena, sob os olhares chocados, murmurantes e, em muitos casos, temerosos.
No caminho, foi interceptado.
Um jovem robusto, cabelos castanhos curtos, olhos negros intensos e uniforme marcado com o emblema dos Punhos de Aço bloqueou seu trajeto com um sorriso firme.
— Bryan Blake. Sou Dorian Vraek, Primeiro Líder dos Punhos de Aço. Gostaria que considerasse se juntar à nossa facção.
Bryan olhou-o diretamente, avaliando-o com frieza e lógica. Dorian era forte — a postura dizia isso — mas ainda assim, não suficiente para chamar seu interesse naquele momento.
— Agradeço pela oferta. Mas vou recusar. Ainda não é o momento.
Dorian sorriu, como se já esperasse aquela resposta, e deu um passo para o lado, permitindo sua passagem, sem insistir.
Bryan seguiu seu caminho até o dormitório E-1.
Quando finalmente adentrou seu quarto, trancou a porta com um gesto, fortalecendo a barreira mágica com sua própria assinatura de mana. Retirou o uniforme, jogando-o de lado, revelando o corpo em plena forma. Cada linha de músculo parecia esculpida com precisão cirúrgica: ombros largos, abdômen trincado, costas definidas em V, como um guerreiro de lendas antigas.
Entrou no banheiro. A água quente escorria pela pele, levando consigo o suor, o sangue seco e a tensão do combate brutal que travara. Passava os dedos pelos cabelos brancos, lavando-os com firmeza, sentindo o peso da batalha deixando seus ombros.
Então, o seu dispositivo mágico pulsou.
[Solicitação de Entrada no Quarto: Aceitar?]
Bryan franziu o cenho.
— Agora não.
Negou a solicitação.
Segundos depois, outra notificação idêntica. E outra. E outra.
Ele cerrou os dentes.
— Porra... Deixa eu tomar um banho em paz!
Ignorou as solicitações, concentrando-se em terminar o banho. Cada vez que a água quente batia contra sua pele, limpava não apenas a sujeira física, mas a exaustão mental de um dia anormalmente intenso.
Secou-se rapidamente, passando a toalha pelo corpo largo, deixando a toalha pendurada no suporte ao lado. Nu, atravessou o corredor interno em direção à cama, ainda massageando a nuca.
Quando saiu, parou.
Ali, de pé no meio do quarto, estava uma jovem que não deveria estar ali.
Cabelos loiros claros, ondulados até a cintura, capturando a luz suave do ambiente. Olhos azul-acinzentados brilhando com uma mescla de arrogância e surpresa mal contida. A pele, pálida e perfeita, parecia quase etérea, como se feita para ser admirada sob o luar. Vestia o uniforme da Classe B, bordado com fios dourados — símbolo inequívoco da liderança da Alvorada Arcana.
Era Hanna Velmira.
Antes, enquanto esperava impaciente do lado de fora do quarto, seus pensamentos fervilhavam:
— Se esse idiota acha que vai me fazer esperar, está muito enganado!
Usou um feitiço de intrusão, contornando a barreira de segurança padrão, e adentrou o dormitório de Bryan sem permissão formal.
Mas a cena que encontrou a deixou completamente sem palavras.
O jovem à sua frente era inacreditável.
Cabelos brancos molhados, alguns fios grudados à testa larga e imponente. Corpo alto, músculos marcados como mármore polido, cada fibra visível como um testemunho silencioso de pura força. O abdômen rígido, as coxas largas e fortes... e então, inevitavelmente, seus olhos desceram.
Hanna sentiu as pernas tremerem.
— Por órbitas... — pensou, em pânico interno, o rosto inteiro explodindo em rubor escarlate.
Antes que pudesse sequer piscar, Bryan já estava diante dela.
Com um movimento tão rápido quanto um raio, agarrou-a pelos pulsos e a pressionou contra a parede do quarto. O calor de seu corpo nu emanava uma intensidade quase insuportável.
A voz dele cortou o ar, tão fria quanto uma lâmina nua:
— Quem é você? E por que invadiu meu quarto?
A respiração de Hanna era rápida, descompassada. Cada batida de seu coração ecoava como tambores de guerra. Seu rosto, ainda vermelho, contrastava violentamente com seus olhos — olhos que agora faiscavam não apenas vergonha, mas orgulho ferido... e um desejo confuso e crescente.
Por um instante, houve apenas o som de suas respirações misturadas no ar.
Hanna, mesmo presa, ergueu o queixo com desafio.
— Solte-me, Bryan Blake. — disse, tentando manter a voz firme. — Eu sou Hanna Velmira. E não vim aqui para ser tratada como uma criminosa.
Bryan a fitou por longos segundos, seus olhos âmbar penetrando até o fundo de sua alma, pesando cada palavra, cada intenção.
Então, sem soltar seus pulsos, aproximou ainda mais o rosto do dela, tão perto que Arhanna sentiu o calor de sua respiração.
— Então fale. — murmurou ele. —